terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Do coração da África

Mesmo antes de chegar a tua costa
Já amo a terra descascada
De árvores cortadas, comida cozida,
Onde pisa a dança despreocupada
De infinitas infinitas famílias.

Cultivando machamba* de dois tomates,
No máximo um negócio por dia.
Crianças ficam na casa do vizinho,
Porque todas a todos pertencem
E cada mãe é também ama de leite.

Uma vila tem galinha do mato
Que exibe aprumado o pescoço azul.
Outra cria cabras que parecem cavalo.
Outra acumula latas enferrujadas
Laranja vivo que mastigam
Os porcos sob a luz do pôr-do-sol.

Crianças que se enfileram nuas
A beira do lago somente para
Apertar a mão do estrangeiro.
Crianças que ainda não sabem pedir,
Mas já sabema língua dos negócios.

Mil receitas para fazer cachaço
Mil pais caindo bêbados chatos.
Exército de bebês correndo sobre
Plantações de magros vegetais.
São as palhotas mesmo iguais?

Lugar que somente se adivinha
Pela inversão de estereótipos,
Sempre inconsciente se entendido.
Vida de começo em media res
De pais que são filhos e vice-versa.

*pequena plantação

Poema Colagem Cape Town

A cidade vibrando quebrada
A metrópole viva estragada
As bitucas de cigarro catadas no chão
Se agrupam em um colchão na casa abandonada de um mendigo.
Pedintes pedindo coisas que se tem mas não se quer dar porque daí não se vai mais tê- las.

Ah! As veias pulsantes de luzes, impulsos elétricos, histéricos, sintomáticos de cabeças que ouvem muito barulho. Serpente de luz, anágua macroeletrônica.
Aonde ficam tuas palavras nessa brincadeira?
Quem te ouve cidade mãe? Quem se ouve na vila de cães?
Sim, sorriso incausado, cumprimento casual, encontro no absurdo, maravilha, Carnaval!!
E depois disso cavalo de pau? 180 graus? Levanta a poeira para depois baixar?
O diferente queres afugentar?
Já no fosso do castelo a água está suja e a lua aparece esverdeada!
E vives cidade! Vais ao trabalho, agüentas longajavascript:void(0)s filas, escondes a bolsa e imaginas despedidas, mas ficas!!
De onde tanta vontade? Até vitalidade? Por que não te deixas arrastar na Próxima tormenta, arrasar na próxima chuva ácida?
Há tantos penhascos bonitos por ti, por que não pulas?
Há tantas armas perdidas por ti, por que não as disparas, não te ajudas?
Aí estará para mim teu eterno mistério ó caixa de pedras.
Que dessas montanhas de carne se formam humanos cujo amor mesmo que canalizado cloacalmente ainda brilha, nem que seja por um pequeno tecido, tenra boca, uma festa oca.
Que te esquadrinhes, te distrites, mas que ainda existam canais que formem fluxos de águas autênticas, vestidas de formas excêntricas.
Brigas, tens porquê brigar, não gritas, mas tens porquê gritas, cantas!
Absurdo do absurdo, cantas, como se vivesses entre chafarizes! E crias chafarizes!
Danças! Assim como nada tivesse acontecendo, por um momento não sentes nada fedendo.

A criançada se molha, se lambuza, joga bola, cresce, espanca, abusa, usa, recusa, se culpa, acaba, reclusa. E aí explode a represa, busca a certeza, se esconde no parque, brinca de arte e parte. Volta, vira parte. É preta e se pinta de preto, é branca e se veste de medo; desde cedo aprende o segredo, por isso cala e vai para a cama mais cedo.
Tchau Tchau.. Beijo Beijo.
Olá minha princesa.
Olá meu Princeso.

Meu sonho é ser guerreiro e o dele é conseguir emprego.
O meu é ser dona de casa e o dele(ou dela) é encontrar um bofe.
O meu é jogar Rúgbi e o dela é concerto de roque.
E a gente caminha junto né, vou te dizer que não fala muito, porque a coisa andou meio tensa.
Teve gente arranhado Jaguar, gente queimando loja.
Mas que podemos fazer? É no famoso tem que ser, porém também no pode ser, que encontramos forças para dizer:
Sou, cidade. Sou cidade.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Gritode um jovem africano!

I
Arranjei uma manga suculenta e grande.
Deve ser suficiente para a tarde
Já que o barco ficou preso,
E o turista não deu dinheiro.

Logo é natal, dia de comer arroz,
Falar com a boca cheia e projetar a barriga.
Me ensinaram que nessa data
Nasceu um branco cabeludo e alto
Que não cuspia fogo nem dormia de dia.
Falava de pombas e de um grande senhor,
Abria bocas e perdoava travessuras.

II

Me dê algo elétrico
Nem que seja chicote
Pra marcar de neon
Minhas costas amargas.

Pinte o céu de vermelho
Desde que chova das verdes!
Dê-me um grão, faço refeição,
Ou repetido refrão que faço lema.

Se for famoso estampa meu peito,
No significado se dá um jeito
É só o tecido proteger do vento.
Todo o homem é igual em direito
Então quero ser igual ao mundo inteiro!

Ouvi de cidades distantes
Onde se entralaçam brilhantes
Luminosos em cruzamentos
Comandados por luminosos.

Vou pedir ao secretário
Para lá botar meu barraco.
Eu qero ver se pesco rato
Na lua de São João,
Como o meu avô me ensinou.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Caleidoscópio Africano


O mistério dos sexos:
Cantigas e camisas
E as cambiantes capulanas*.

Cabanas de palha
Pilhas de carvão as rodeando.
Fumaça de lixo junto as cabras pastando.

Moscas passam em si urticando,
Sonhos de conforto desnecessário,
Atrás os holofotes de um comercial.

Cordas ligam tudo,
Fecham sacos, amarram motores,
Afinam tambores, prendem os loucos.
Arames entretecidos viram carros
De brinquedo, que transportam os donos.
Criatividade mágica provem da precariedade.

Precocidade, densidade que encurta a vida.
Sonhos vetados e os que profundos vingam
Sem você sonhar em ver.

Adjetivos, esses ajudantes sempre aleijados
Insuficientes em afirmações africanas.
Selvagens, haha, os chamam de selvagens.
Substantivos perdendo sua generalidade.
Chuva só é chuva se encharca.
Após se ver um baobá**
Nenhuma outra se chama árvore.

A vastidão dos desertos e as savanas.
A presença constante do horizonte
Vazio, não figurativo.
A figura que aparece do horizonte
Pede um cigarro e desaparece do lado oposto.

Sonhos de conquistadores
Lanças, tochas, rituais,
A feitiçaria onipresente escondida.
Nomadismo e todas suas conseqüências.

As primeiras migrações humanas,
A emoção de pisar em algum lugar
Onde nenhum portador de dúvidas havia pisado.
Tremer frente ao primeiro frio congelante,
Descobrir o fogo novamente.

Tudo pairando, cavalos marinhos no ar
Prontos a se inspirar, de boca aberta.

Sobre terra que não é de palavras
Palavras não irão resolver.
Aprender não se explica menino!
Vai ver e sai sabendo que não viu.

*Capulanas são os lenços de padrões coloridos utilizados pelas mulheres na África para se vestirem, carregar bebês, guardar roupas ou cereais.
**Imbondeiro: Árvore de grande circunferência existente na África, tema de muitos mitos, que normalmente por ser boa sobra se torna o centro de um vilarejo.