quinta-feira, 19 de julho de 2012

Vermelho


Sombra, rainha da direção
Assassina do movimento
É sua homogeneidade
Uma invenção humana
Ou o humano uma invenção dessa?

A civilização, só mais um
Grande empreendimento do conforto,
Com seu infinito potencial
De construir e sentar.

Nós, aves planando
Cheias de ditos bonito e repetitivos
Que as vezes entendemos
Quando chove antes de deitar.

Você, soprando palavras
De um café carcomido  e vermelho,
Longe como a água.
És o que sobra, perigo do vagar
E recebes meu córrego tranqüilo.


Versão Poética Sonora:

http://soundcloud.com/denis-saffer/vermelho

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Ambulantes

Acho que as ambulâncias vêm me seguindo
As encontro a cada instância, a cada esquina.
E como é agradável seu efeito doppler:
Notas alcançando o grave
Dor de outro se distanciando
Seguro sentimento de que não há
Nada para furar os fones de ouvido.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Enfim


Enfim, o que importa é ser vivo
Sem diferença entre o bêbado, o engenheiro, o fuzileiro naval:
Quem não traga não morde.

Tragam-me eslavas e escravas, ardentes como peles opostas
Tragam cigarros longos, excessivamente longos.
Sem traço e Norte, sem aconchego,
Não há vida fora disso.

Os conceitos se somam na mente,
Um aterro de armações de ferro
Bases de prédios que odiamos,
Como um velho que odeia ao seu câncer, seu.

E vocês silentes ou discursivos
Já sentiram a poeira cortante
Da caçamba de caminhão?
Já fumaram o ópio indiano
Frente a desfiles de seda e música
E jóias e cores e notas outras?

Escuto a balela e acredito,
Como Jó em Deus.
Promessa de entendimento perdido
Máscara de beleza se botando entre tudo e tudo.
Queria poder ver os pepinos nos olhos.

domingo, 1 de julho de 2012

Anti Ode a Walt Whitman III


Estabelecer o caos, pintar vidros,
Serrar braços e braços de estátuas.
Liderar hordas de mendigos com bandeiras pontiagudas
Ajudar em enterros, cascudos em crianças sem culpa.

Furar na rua os canos de dinheiro que ligam
Os caixas eletrônicos aos bancos.
Chamar os leprosos para lá deixar os dedos.
E depois ver a multidão frente a membros e valores.

Criar um país, um sistema de voto diferencial
Uma distribuição de renda determinada pela forma da fenda nasal

Fazer um inventário das pintas do próprio corpo
A partir delas pintar o quarto do inimigo.
Contar histórias mentirosas que se contradigam.

Rir da dor doendo do riso sem sentido.
Sentir a maciez da carne do passarinho
Pintar de vermelho o corpo da fêmea pura
Penetrar bebendo o colostro na que recém-pariu.

O físico pode assim definhar satisfeito?
Virão os devaneios de nuvem e éter.
Após o sono sem sonhos?

Sei que o caminho é musgo vivo
Que a água movida às vezes é morna.
Sei que tenho pés e braços e nado
Rápido, antes que a maré baixe.